“O souvenir é a relíquia secularizada.
O souvenir é o complemento da «vivência». Nele reflecte-se a crescente
auto-alienação do indivíduo que faz o inventário do seu passado como haveres
mortos. No século XIX a alegoria abandonou o mundo exterior para se instalar no
mundo interior. A relíquia vem do cadáver, o souvenir vem da experiência morta
que, eufemisticamente, se designa vivência.”
— Walter Benjamin, Parque
Central
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O turismo é hoje um dado adquirido do
nosso quotidiano e uma figura fundamental da estratégia e da retórica económica
nacional. Os últimos anos, anos de crise e de austeridade, viram crescer de
forma explosiva o número de turistas nas principais cidades portuguesas. Não é
um turismo tipicamente ou totalmente sazonal, tem muitas variantes e muitas
formas de ocupação e de duração. E é,
sobretudo, um turismo que articula todo um conjunto de outros fenómenos que
através dele, em nome dele, ou a partir dele (e de uma forma drástica), têm
vindo a alterar e a transformar o quotidiano e a paisagem urbana e social das
cidades: desde os processos violentos de “gentrificação”, até à expulsão de
muitos habitantes para zonas periféricas da cidade, desde os processos de reabilitação
urbana (dominados pelas lógicas de mercado e pela especulação imobiliária) até
à monofuncionalização e museificação dos
centros históricos. Isto significa dizer que no chamado “fenómeno do turismo”
não pode estar em causa, simplesmente, uma leitura dos benefícios económicos
mais imediatos, mas o seu impacto na composição e na vida quotidiana das
cidades: do problema da habitação e do “direito à cidade” à transformação dos
centros históricos em puros parques temáticos. E, claro, importa em primeiro
lugar reconhecer que “a lógica do turismo assenta num paradoxo: ele alimenta-se
daquilo que destrói. Vende o produto que não cessa de destruir”. As recentes
manifestações de descontentamento em Veneza e em Barcelona relativamente aos
efeitos de uma política de turismo desregulada e massificada, devem-nos servir
de alerta para pensar a “sustentabilidade” das actuais políticas de turismo em
cidades como o Porto e Lisboa e para construir um discurso acerca do turismo e dos
seus efeitos que não seja única e exclusivamente laudatório.
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