_____________________
Planning
for protest
_____________________
Ben Allen, James Bae, Ricardo Gomes, Shannon Harvey,
Adam Michaels
(scroll down for english version)
-------
“Planning for
Protest” é uma publicação, uma exposição e um projecto associado da Trienal de
Arquitectura de Lisboa. Organizado por Ben Allen, James Bae, Ricardo Gomes,
Shannon Harvey e Adam Michaels, o projecto explora tanto as definições
arquitectónicas como sociais do protesto à luz da actual crise financeira
global. Os escritórios de arquitectura, testemunhas em primeira mão destes
eventos, disponibilizam estudos e propostas de projecto para espaços de
contestação dentro das suas cidades.
Os participantes são:
Antonas Office (Atenas), Studio Miessen (Berlim), studioBasar (Bucareste),
Cluster (Cairo), Culturstruction (Dublim), Superpool (Istambul), Ateliermob
(Lisboa), Public works com Isaac Marrero-Guillamón (Londres), Ecosistema Urbano
(Madrid), Srdjan Jovanović Weiss / NAO (Nova Iorque), PioveneFabi with 2A+P/A
(Roma), Vapor 324 (São Paulo).
Inclui dois ensaios
de Daniel Oliveira (jornalista) e Pedro Levi Bismarck (arquitecto).
O catálogo da exposição está à
venda em Lisboa na Letra Livre, na Ler Devagar e na Técnica Livraria e tem um
custo de 35€. Brevemente estará no Porto. Pode ser encomendado online.
Local: Espaço
Ground Floor Act, Rua dos Douradores 222 – junto à Praça da Figueira.
Horário:
segunda-feira a sexta-feira, 11h – 19h.
Até
29 de Novembro
-------
O
idealista pode imaginar o mundo como se este partilhasse uma forma rudimentar
de sistema de valores. Quer esta seja ou não uma verdade aplicável com sentido
para diversas sociedades, para aqueles que se encontram tão em oposição directa
entre si ao ponto de tornar intratável esse pensamento, podem fazer-nos parar
para ver isto como remotamente atingível. Considerando a história de cada
sociedade, com o seu próprio conjunto de credos e critérios religiosos que
ajudaram a moldar o que escolheram para fundar as suas convicções, a ideia de
um único e providente sistema de valores ainda parece mais distante da
compreensão da realidade social. Somos frequentemente levados a acreditar que
não há uma única verdade, mas apenas a verdade que nos é disponibilizada no
imediato.
Dar voz
a um ponto de vista dissidente face a situações insustentáveis está no âmago do
protesto: ao longo dos últimos anos, existe a sensação de que um tal
descontentamento público sobre assuntos locais se disseminou numa pandemia
global. Assistimos a protestos em massa nas ruas da Europa, do Médio Oriente,
na Ásia e nas Américas, todos despoletados por várias doenças sociais, e de um
modo epistémico, ligados por uma força confiante numa via comum. Planning
for Protest surgiu no contexto de uma conversa sobre o que estava a
acontecer nestes focos, um pouco por todo o mundo, com especial ênfase em como
os próprios espaços onde estes eventos ocorreram ajudaram a moldar ou formar, senão
mesmo a envolver, o sucesso ou fracasso da mobilização pública de cada cidade.
Da mesma forma que a convenção em massa das pessoas cria a voz destes
protestos, queríamos perceber como estas ruas e praças, os seus edifícios,
formam o pano de fundo dos palcos destes protestos.
Pedimos
a 12 arquitectos/escritórios de arquitectura, sediados em cada uma das 12
cidades, para pensar de forma expressa naquilo que observaram nas ruas à medida
que estes protestos surgiram e cresceram. A partir daqui surgiram 12 tipologias
diferentes de onde, quando e como protestamos. As suas contribuições mostram
cada protesto como um momento único que transpira quando o espírito colectivo
preenche as artérias do planeamento urbano gastas pelo tempo. Embora
aparentemente com início num ponto de limitação, os participantes oferecem as
suas próprias propostas sobre o que podemos fazer de melhor a partir do que já
temos. Ao utilizar meios tanto velhos como novos, desde mudar a orientação das
ruas ou usar a internet como veículo de intervenção em tempo real, as suas
ideias existem enquanto estratagemas para futuras formas de protesto. Seria
errado pensar que estas serão as últimas; e, nas suas diferenças, partilham uma
fidelidade por um ideal. As suas propostas mostram os protestos como um diálogo
contínuo que não só perdura mas tem de continuar, na esperança de que a Grande
Conversação desta época seja “de facto interminável, não no sentido de uma
repetição infinita, mas no sentido de uma criação infinita, exactamente da
mesma forma com que Chomsky caracteriza a linguagem em si - isto é, fazendo uso
infinito de meios finitos”.[1]
Assinalou-se
1968 como a era dourada dos protestos. Como então, os protestos actuais
partilham razões comuns de indignação suficiente para agir: sistemas
capitalistas, elitismo burocrático, negação de direitos individuais e uma
guerra interminável, entre outros subníveis de injustiças. Nascida numa deriva
trans-geracional entre o tempo de recuperação de uma guerra justa e boa
(Segunda Guerra Mundial) e a primeira da sociedade contemporânea -
aparentemente incompreensível - a ter cobertura televisiva nocturna (Vietname),
não seria errado encarar 1968 como o momento em que a Esquerda encontrou uma
identidade funcional na classe média.
Não que
isso fosse facilmente compreendido ou bem aceite por todos. No mínimo, era mais
difícil encontrar alguém que não estivesse irritado com alguma coisa algures,
do que categorizar os vários eventos a terem lugar globalmente. Pelas suas
múltiplas razões, na reflexão contemporânea estes podem ainda ser difíceis de
compreender. Numa era definida pela Guerra Fria, postulada por perceber qual o lado
bom, sendo que ambos eram igualmente maus, a única coisa mutuamente segura em
1968 eram as moralidades em competição. Não é surpresa nenhuma que as pessoas
então acorressem em massa às ruas.
O
idealista como manifestante honesto esperaria sem dúvida que se atingissem
estes dois objectivos devido à sua disposição para se comprometer com um acto
de protesto: em primeiro lugar, que a sua voz seja ouvida pela entidade que
causa o mal-estar; em segundo lugar, e principalmente, que a sua voz leve a uma
mudança rápida e efectiva no sentido da correcção de uma injustiça
particularmente odiosa que uma sociedade é forçada a suportar. Se olharmos para
a História, pouco nos leva a pensar que o idealista irá ver retorno justo do
seu investimento. Nesse sentido, o motivo pelo qual protestamos reflecte mais
um traço básico e exclusivamente humano: o desejo. O que queremos de forma
inata é provavelmente o que iremos perseguir mais fervorosamente.
Apesar
de desejarmos algum nível de mudança ao que pensamos ser abertamente injusto, a
maioria da população humana localiza-se nas zonas de cidades, com a sua própria
noção de governança. É o dilema do dar, tirar e perder como afirmado nos
escritos de Thomas Hobbes no século XVII: a única coisa garantida ao agente que
se muda de um estado de Natureza para um estado Civilizacional é o direito
absoluto de processar os outros à vontade. Hobbes, quando olhou para as várias
instâncias de celebrações nacionais e de protesto público nos portões do
Palácio de Buckingham, uma praça que começou a desprezar pelo seu elevado custo
de manutenção durante a sua vida, soube o que estava implícito: os assentos do
poder irão transmutar-se nas casas de férias dos bancos das classes dominantes.
Planning
for Protest é em termos de valor facial um projecto que
documenta o papel da arquitectura no modo como os protestos acabam por se
formar. É certamente este o caso. À medida que os protestos se tornam eventos
mediáticos no seu direito, queríamos que o nosso projecto expusesse o que é tão
óbvio e frequentemente descurado: os espaços urbanos efectivos em que têm lugar
estes protestos. Os participantes neste projecto concederam-nos uma compreensão
significativa sobre os “traços” psicológicos e físicos das próprias cidades
onde trabalham, preenchendo-nos as lacunas daquele espaço negligenciado. Existe
uma ligação extraordinária que cada participante tem com a sua cidade, que se
torna evidente quando nos deparamos com as suas propostas. Estávamos confiantes
em observar um nível de erudição de todos os nossos participantes, mas formos
agradavelmente surpreendidos pela presença de um humanismo imbuído em todas as
suas descobertas. É um humanismo que brota de um sentido do lugar e reflecte a
afinidade contínua - e ligação sempre em crescimento - dos nossos participantes
aos espaços. Fomos profundamente afortunados e estamos muito agradecidos por
ter tido a oportunidade de colaborar com eles neste projecto.
1.
Julian
Boyd, Address to the graduating class of University of California at Berkeley,
1994
ENGLISH
VERSION
-------
Planning for Protest is a
publication, exhibition and associated project of the 2013 Lisbon Architecture
Triennale.
Organized by Ben Allen, James
Bae, Ricardo Gomes, Shannon Harvey and Adam Michaels, the project explores both
the social and architectural definitions of protest in light of the current
global financial crisis. Architectural offices witnessing these events
first-hand will provide case studies and project proposals for contested spaces
within their own cities.
Participants include: Antonas
Office (Athens), Studio Miessen (Berlin), studioBasar (Bucharest), Cluster
(Cairo), Culturstruction (Dublin), Superpool (Istanbul), Ateliermob (Lisbon),
public works with Isaac Marrero-Guillamón (London), Ecosistema Urbano (Madrid),
Srdjan Jovanović Weiss / NAO (New York), PioveneFabi with 2A+P/A (Rome), Vapor
324 (São Paulo).
Includes two essays by Daniel
Oliveira (journalist) and Pedro Levi Bismarck (architect)
The publication can be purchased online.
Exhibition: Ground Floor Act
space, in Rua dos Douradores 222 – Praça da Figueira.
Monday to Friday, 11h – 19h.
Until 29th November.
-------
The
idealist can think of the world as sharing some rudimentary form of a value
system. Whether or not this is an applicable truth meaningful across various
societies, to ones so seemingly at direct odds against one another to make such
a thought intractable, might give us pause to see this as even remotely
achievable. Factoring in the history of each society as having their own set of
creeds and religious criteria that have helped shape what they can choose to
anchor their beliefs in, the idea of a singular and provident value system
seems further from the grasps of social reality. We are often led to believe
there is no single truth but the truth that is immediately availed to you.
Vocalizing
a dissenting viewpoint in the face of untenable situations is at the core of
protesting: throughout the past few years, there is a sense that such public
disgust of local issues has networked into a global pandemic. We have seen mass
protests in the streets of Europe, the Middle East, Asia, and the Americas, all
ignited by various social ills, and all in some epistemic way, threaded by a
faithful strength of line to one another. Planning for Protest came about as a
conversation over what was happening in these flashpoints throughout the world,
with a special focus on how the very spaces in which they took place helped to
shape or form, if not circumvent, the success or failure of each cities’ public
mobilization. In as much as the mass convention of peoples creates the voice of
these protests, we wanted to see how the streets and squares, its buildings,
form the backdrop of these protests’ stages.
We
asked 12 architects/architecture offices embedded within each of the 12 cities
to think clearly of what they saw in their streets as these protests rose and
grew. From this, 12 different typologies of where, why, and how we protest
formed. Their contributions show each protest as a unique moment that
transpires when collective spirit fills the time-worn arteries of urban
planning. While seemingly beginning from a point of limitation, the
contributors offer their own proposals on what we can best make of what we
already have. Utilizing means both old and new, from changing the orientations
of streets or using the internet as a vehicle for real-time intervention, their
ideas exist as stratagems for future modes of protests. It would be wrong to
think these will be the last; and, in their differences, they share a fealty to
an ideal. Their proposals show protests as an ongoing dialogue that not only
endure but must go on, in the hopes of this era’s Great Conversation being
“indeed endless, not in the sense of endlessly repetitive, but in the sense of
endlessly creative in exactly the way that Chomsky characterizes language
itself—that is, as making infinite use of finite means.” [1 ]
It
has been remarked that 1968 was the golden age of protests. Like then, the
protests of today share common reasons for people to be disgusted enough to
move: capitalist systems, bureaucratic elitism, negation of individual rights,
and an endless war, amongst other sub-levels of injustices. Borne on the
cross-generational drift between the recovery time from a just and good war
(World War ii) and that of society’s first contemporary—and seemingly
incomprehensible—one, and the first to be covered nightly by television
(Vietnam), it would not be wrong to view 1968 as the moment when Leftism found
a functional identity to the middle-class.
Not
that it was easily understood, or taken well by all. If anything, it was harder
to find someone who wasn’t pissed about something, somewhere than to categorize
the various events taking place globally, for their multiple reasons that in
contemporary reflection still may be elusive for the understanding. In anera
defined by Cold War posturing in which either side was good while being
simultaneously equally bad, the only thing mutually assured in 1968 was
competing moralities. It is no surprise that people took to the streets en
masse.
The
idealist as the earnest protestor would undoubtedly hope for these two things
to be achieved for their willingness to commit to an act of protest: firstly,
that their voice can be heard by the entity causing the malaise; secondly, and
most importantly, that their voice leads to a rapid and effective change
working towards the correction of a particularly odious injustice a helpless
society is made to bear. If we take a look at the track of history, there is
little to think that the idealist will in anyway see fair returns on his
investment. In that sense, why we protest is most reflective of a basic and
uniquely human trait: desire. What we want innately is most likely what we will
most fervently pursue. Though we desire some level of change to what we
perceive as openly unfair, most of the human population throughout this world
are localized within the areas of cities with their own ideas of governance. It
is the give-take-and lose dilemma as proscribed in the political writings of
Thomas Hobbes in the 17th Century: the only thing guaranteed to the agent
moving from the State of Nature to that of Civilization is the unmitigated
right to sue each other at will. Hobbes, when looking at various instances of
national celebrations and public protest at the gates of Buckingham Palace, a
square he learned to despise for it costliness of upkeep over his lifetime,
knew what was implicit: seats of power will morph into the vacation homes of
ruling-class banks.
Planning
for Protest is upon face value a project documenting architecture’s role in how
protests come to shape themselves. This is certainly the case. As protests
become media events in their own right, we wanted our project to shed light on
what is so obvious that it is much too easily—and often is—overlooked: the
actual urban spaces in which these protests take place. The contributors to
this project have each granted us remarkable insights to the psychological and
the physical ‘traits’ of their own cities they work in, filling in the gaps for
us of that overlooked space. There is a remarkable connection that each
contributor has to their city that is apparent when encountering their
proposals. We were confident in seeing a level of erudition from all our
contributors, but we were pleasantly taken aback by the well-source of humanism
imbued in all their findings. It is a humanism that springs from a sense of
place, and speaks to our contributors’ ongoing connection— and ever-growing
attachment—to them. We have been deeply fortunate and thankful to have had the
chance to collaborate on this project with them.
1.
Julian
Boyd, Address to the graduating class of University of California at Berkeley,
1994