Acredita na democracia?




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#41 • Inverno 2024 • Acredita na democracia?

 

editorial

É sob o signo dos 50 anos do 25 de Abril, mas também de uma pergunta, «Acredita na democracia?» — resgatada de «Que Farei Eu com Esta Espada», filme de João César Monteiro, de 1975 — que organizamos esta edição de Inverno de 2024 do Punkto, a terceira edição em papel. Aos diversos artigos publicados nestes últimos meses adicionamos outros dois do nosso arquivo, imprescindíveis para tentar uma espécie de estado da arte da democracia. «Loucos e sábios», de Jacques Rancière, e «A utilidade de André Ventura», de Luhuna Carvalho, juntam-se assim a «Dizer qualquer coisa de esquerda», a «Je est une autre: a persistência do desejo fascista» e ao texto «A moralização da política». Mas o texto de despedida de Toni Negri «Que a eternidade nos abrace» e a nota filosófico-militante que Luhuna Carvalho dedica a esta figura maior do pensamento e da militância política das últimas décadas, constituem igualmente chaves de leitura fundamentais para compreender aquilo que muito propriamente se tem vindo a designar como uma crise: crise da democracia, crise da social-democracia, crise das suas instituições políticas, económicas e sociais, com a emergência da extrema-direita e do fascismo às mãos de um neoliberalismo financeiro que fez daqueles que eram os direitos e conquistas de Abril — habitação, saúde, educação — os eixos fundamentais da sua estratégia de acumulação de capital, expropriando a classe média e aprofundando o abismo da desigualdade. Demasiadas linhas de fuga para uma edição que merecia ser melhor, que deveria talvez propor uma leitura mais ampla e crítica sobre o conceito e a história da palavra democracia: nas suas variações, declinações e traições — democracia liberal, democracia representativa. Talvez por isso — não só, mas também — se torna imperativo terminar esta edição com mais uma reflexão sobre a Palestina — o texto de Samera Esmeir, «Dizer e pensar uma vida para além do que o colonialismo de ocupação fez». Ora, Israel: esse ponto de implosão onde a democracia se transformou num fascismo teocrata; esse ponto de implosão onde a democracia se transformou numa máquina de genocídio; esse ponto de implosão em que a instrumentalização extrema da democracia pelo capital fez desta uma forma sem conteúdo. Não há nada mais sintomático do perigo que impende sobre as nossas democracias do que a passividade das instituições políticas e sociais ocidentais relativamente ao genocídio na Faixa de Gaza. A censura declarada relativamente a todos aqueles que têm vindo a expor a situação catastrófica que se vive em Gaza merece uma reflexão urgente. Veja-se o caso de Léopold Lambert, impedido pela direcção da ETH de Zurique de participar numa sessão organizada pelos estudantes de arquitectura desta universidade suíça. A resposta à invasão russa da Ucrânia foi imperativamente colocada como uma guerra da civilização contra a barbárie, da democracia liberal ocidental contra a ditadura e o despotismo. Tudo era «preto e branco»; a luta do bem contra o mal, a autonomia territorial, a defesa intransigente dos direitos humanos. Mas os últimos seis meses de ofensiva israelita mostraram que para o Ocidente mais universal que os seu valores só mesmo a realpolitik do capital; e mostraram, uma e outra vez, que a civilização é a barbárie: ninguém melhor do que os ocidentais para produzir tão bem, tão sofisticadamente, eficazmente e cinicamente, a barbárie — em nome, claro, da democracia e da liberdade A distribuição desta terceira edição do Punkto está a cargo da contracapa. O número 3 / 41 pode ser adquirido por 3€ nas seguintes livrarias no Porto: Cinema Batalha, Flâneur, Térmita, Trama e Utopia; e, em Lisboa, na Leituria, Snob  e Tigre de Papel. Encomendas devem ser feitas directamente à contracapa ou às próprias livrarias

 

artigos

Dizer qualquer coisa de esquerda

Pedro Levi Bismarck

Je est une autre: a persistência do desejo fascista  

Paulo Ávila

A utilidade de André Ventura

Luhuna Carvalho

Loucos & Sábios

Jacques Rancière

A moralização da política

Pedro Levi Bismarck

Que a eternidade nos abrace

Toni Negri

O bom, o mau e o militante. Toni Negri (1933 - 2023)

Luhuna Carvalho

Dizer e pensar uma vida para além do que o

colonialismo de ocupação fez

Samera Esmeir

 

Artigos online

Palestina — Diário Retrospectivo

Paulo Ávila

Escola do Porto: um princípio de desassossego  (— a propósito do centenário de Fernando Távora)

Pedro Levi Bismarck

«O canteiro e o Desenho» de Sérgio Ferro

Bernardo Amaral & Joana Vieira da Silva